O paradigma anarquívico

O paradigma anarquívico

Coordenador: Marcelo R. S . Ribeiro

Período: abril de 2020 até o momento (projeto em desenvolvimento)

Resumo

Considerando a questão do arquivo na história dos meios e das formas artístico-culturais audiovisuais como um problema duplo, que concerne tanto aos modos de arquivamento (e apagamento) de traços e rastros, quanto às relações variáveis estabelecidas com o que foi previamente arquivado, este projeto aborda diferentes modalidades de relações críticas e inventivas estabelecidas com o arquivo colonial-moderno, composto por registros de figuras de alteridade e diferença (humana ou não humana). Pretende-se diferenciar as principais abordagens críticas e transbordamentos inventivos que tornam possível reconstituir histórias reprimidas, elaborar memórias silenciadas e imaginar futuros interrompidos, por meio da perturbação do arquivo como ordem informacional fundada em uma série de apagamentos, de modo a evidenciar e confrontar a violência anarquívica que funda o arquivo. Para analisar o paradigma anarquívico, entendido como conjunto de abordagens críticas e transbordamentos inventivos do arquivo colonial-moderno, propõe-se o desenvolvimento da arqueologia do sensível como abordagem metodológica, em diálogo com a arqueologia crítica da imagem e com a arqueologia das mídias (no campo interdisciplinar em que a área de Cinema e Audiovisual pode ser situada, entre Artes e Comunicação), assim como com as reivindicações da arqueologia na filosofia e nas ciências humanas (na arqueologia dos saberes, enunciados e discursos). Para elaborar essa arqueologia do paradigma anarquívico, a pesquisa assume como seu ponto de partida o estudo do Programa Memória do Mundo (Unesco), como metonímia das políticas da memória e das disputas pela configuração e arquivamento do mundo como mundo comum. Investiga-se como as mídias cinematográficas e audiovisuais e o arquivo colonial-moderno participam da iniciativa da Unesco de constituir um arquivo universal da humanidade e do mundo, herdeira de um projeto moderno que remonta ao modelo enciclopédico e se desdobra, atualmente, em torno de problemas como dataficação, cultura algorítmica etc., que também se tornam objetos do paradigma anarquívico. O reconhecimento de que a história contemporânea do Programa Memória do Mundo remonta a uma genealogia moderna conduz a pesquisa a se desdobrar em três momentos analíticos suplementares: o momento em torno do eixo do terror, relacionado ao reconhecimento da violência colonial, em geral, e do trauma da escravidão atlântica, em particular, como constitutivos da modernidade; o momento em torno do eixo do imaginário, decorrente da densidade das figurações de diferença e alteridade sob signos como “índios”, “negros”, “diversidade cultural” etc., no interior da consciência planetária desenvolvida na história da modernidade, entre exotismo, arte e etnografia; e o momento em torno do eixo da extração, vinculado à centralidade da relação extrativista com a “natureza” na definição da economia política moderna. Em todos os momentos indicados, considerando as condições discursivas e midiáticas de diferentes modalidades de relações críticas e inventivas estabelecidas, em diferentes produtos, processos e experiências cinematográficas e audiovisuais, com o arquivo colonial-moderno e a violência fundante que o constitui, a elaboração dessa arqueologia do paradigma anarquívico pretende compreender as configurações estéticas singulares que caracterizam as abordagens críticas e os transbordamentos inventivos nos quais, segundo a hipótese central da pesquisa, a violência fundante do arquivo é duplicada, devolvida e redistribuída.

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